"nenhum católico deve votar no partido da situação
porque ele nos nega a nossa rádio"
(in artigo de Luis de Nacimento, publicado no Angolense, 474, de 15 a 22 de Março 2008)
Os bispos angolanos, na sua última reunião da CEAST, ao abordarem o tema das eleições legislativas de 2008, fizeram apelo ao “voto de qualidade”. A Carta Pastoral associa o “voto de qualidade”, ao voto em consciência; um voto que seja fruto de uma escolha com base na reflexão. Uma reflexão que tenha em conta o estado do país, o estado de pobreza em que os angolanos se encontram, o desprezo que os actuais governantes nutrem pelos angolanos mais carenciados.
Será sempre muito difícil um voto de qualidade (que quer dizer um voto livre) quando sabemos que a maior parte do país vive numa situação de “reserva territorial” imposta pelo partido do poder, apesar de Angola se definir como um “Estado Democrático de Direito”. E, é porque querem manter o país em “reserva territorial” que impedem que a Rádio Ecclesia estenda o seu sinal a todo o território nacional. São muitos anos de negociações, de promessas não cumpridas, de ameaças e de atitudes musculadas para impedir o facto consumado da extensão da Rádio Ecclésia. José Eduardo dos Santos prometeu a extensão mas não cumpriu a sua palavra (o que faz com muita facilidade) e alguns governadores provinciais não se coibiram de usar de meios violentos para fechar manu militari as emissões experimentais da Rádio Ecclésia nas províncias. No entanto, esse mesmo poder não se coíbe de tentar seduzir e comprometer a hierarquia católica na “caça ao voto” para as próximas eleições. O caso mais emblemático foi o da visita de dirigentes do “partido da situação” (nunca achei tão apropriada esta designação, pois eles são efectivamente responsáveis pela situação calamitosa em que o país se encontra) da província de Luanda a Dom Damião Franklin, Arcebispo de Luanda.
Foram ao Paço Episcopal pedir, segundo os próprios “…garantias (…) sobre que contribuição poderá (a Igreja Católica) dar para a realização, com êxito, das próximas eleições legislativas”. Levaram tanto tempo a reconhecer que a igreja Católica tem alguma coisa a dizer em todo este processo. Deixemos os anos de ostracismo de lado e contentemo-nos com o “mais vale tarde do que nunca”. No entanto, ainda assim desconfio que não foi desta vez que foram numa atitude sincera, pois, a comitiva dos dirigentes do “partido da situação” de Luanda não levou qualquer resposta positiva aos fiéis da Igreja Católica (e não só) que há muito vêm reclamando pelo direito de ouvirem a voz da Rádio Ecclésia. É que os Bispos, na Mensagem Pastoral de 24 de Março de 2004, depois de manifestarem “o empenho da Igreja em ser uma isenta parceira do Estado na educação massiva do povo, bem como em colaborar com o Estado na educação dos cidadãos para uma pacífica e sã convivência, que venha a respeitar a ordem pública e quaisquer direitos humanos”, afirmam poder desempenhar cabalmente esta missão educadora se a Igreja poder utilizar “ não só os templos e as escolas, mas também que os fiéis das suas Dioceses” (…) tenham “o direito de ouvirem também eles, a voz da Rádio Ecclésia.” Mas falemos pois de hoje!
A sedução é própria do jogo eleitoral e a ninguém escapou que este mise-en-scène do poder está ligado a contagem prévia de votos. Mas, acham que os católicos, incluindo os do partido da situação, vão dar o voto àqueles que lhes denegam direitos? E a maka da Rádio Ecclésia? A dita extensão do sinal a todo o território nacional que o poder (depois de múltiplas promessas no país e no estrangeiro) continua a condicionar à ambição de cooptação. Os católicos vão votar naqueles que não lhes permitem ouvir a sua própria rádio? É isso que é o voto de qualidade?
No passado, eram evocadas razões de interesse nacional, segundo o qual somente o Estado deveria ter o monopólio da informação nacional (a questão das ondas é um mero pretexto técnico). Mas, em Dezembro de 2003, JES, ao falar na abertura do V Congresso do seu partido, de forma desgarrada de todo o resto, disse que já era tempo de acabar com o monopólio do Estado na televisão. Nessa altura, falava-se que ia abrir uma televisão própria apoiado em amigos de circunstância. Agora, todo mundo sabe, que achou mais cómodo passar o Canal 2, da TPA, para a mão dos filhos. A operação de “privatização da gestão” do Canal 2 foi um expediente rápido que o “chico-espertismo” nacional (ou estrangeiro) ao seu serviço encontrou para operar a privatização não declarada desse canal da TPA. O que lhes vai permitir, para além do mais político e comercial, acumular o capital necessário à posterior aquisição “perfeitamente legal” do referido canal da TPA.
Não importa agora o expediente que é meramente formal, o importante é o que é substantivo: o fim do monopólio do Estado a favor de uma empresa privada. Não há nenhum problema nisso. Mas, o argumento que era (e continua a ser) utilizado contra a extensão do sinal da Rádio Ecclésia (o do monopólio do Estado em relação a rádio de curta frequência que emite em simultâneo para todo o território) cai por terra. Pelos vistos, para este poder, “a empresa dos filhos do Presidente” é mais idónea que a Igreja Católica pois esta não pode partilhar com o Estado a informação falada a nível nacional, no entanto, o Canal 2 pode fazê-lo, ao nível da televisão.
Isto é mais que a habitual raiva autoritária, é uma falta de respeito, uma profunda desconsideração, uma atitude de menosprezo absoluto pelos católicos, em particular, e pelos cidadãos, em geral. A resposta que os católicos podem dar aos senhores que se acham tão poderosos que não respeitam mais ninguém e nos impõem a todos os seus caprichos, com verdadeiros prejuízos para o país, é a de dizer: “meus senhores, quem nega aos Católicos o seu direito de escutar a sua Rádio, não pode pretender contar com o seu voto”. Eis a palavra de ordem para todos (independentemente do chamado partido do coração): “quem nos nega a nossa rádio não é digno do nosso voto”.
Luís do Nascimento
Secretário-geral da FpD
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